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Tenho lido e escutado muito que a faixa
etária média do usuário do Facebook tem aumentado. Os mais jovens estão
buscando outras redes sociais, enquanto os adultos (pre)dominam cada vez
mais. Poderíamos até pensar que esse aumento da idade provocasse então
uma elevação do nível de maturidade, mas não é isso que constato. Tenho
mais a impressão de estar dentro de um enorme jardim de infância
virtual.
Imagine crianças brincando. Elas
pegam um cobertor e duas cadeiras, fazem uma “casinha” com isso e supõem
que é um castelo. Essas crianças vão levar essa brincadeira a sério e
acreditar realmente que estão em um castelo medieval, com rei, rainha,
bobo da corte, cavaleiros andantes e tudo que se tem direito. Isso, no
mundo das crianças, é algo maravilhoso e útil, pois as crianças precisam
da fantasia para se prepararem para a vida real dos adultos. Pois bem,
agora imagine pessoas adultas fazendo o mesmo, não com cadeiras e
cobertor, mas em um mundo virtual, em uma rede social, como no Facebook:
essas pessoas adultas constroem também aqui seu mundo fictício, sua
“ilha da fantasia”, expondo aquilo que acreditam ser, identificando-se
com os folclores e mitos que acham bons. Até aí tudo bem, mas a coisa
começa a ficar problemática quando algumas dessas pessoas começam a
levar a “brincadeira” a sério demais, acreditando nesses folclores e
mitos virtuais e naquilo que expõem de si. O que acontece então é a
mesma coisa como no jogo das crianças: um quer ser o rei do castelo, mas
outros também querem, até o “bobo da corte” acha que o rei deveria ser
ele. Uma menina é escolhida como princesa, mas ela prefere ser rainha, e
a discussão é levada com a seriedade de crise mundial. As crianças
resolvem o assunto de alguma forma, alguns ficam satisfeitos, outros não
gostam, uns ficam embirrados, outros choramingam, xingam, uns se jogam
no chão, esperneiam e se negam a aceitar “as regras do jogo”. E é
triste constatar: há adultos que se comportam da mesma maneira!
Não é isso que vemos diariamente? Gente
levando tudo a sério, como se fosse vida verdadeira, gente egocêntrica,
que acha que tudo gira em torno de sua pessoa (o egocentrismo de
crianças é necessário e saudável – até certo ponto. Já o egocentrismo de
adultos é para mim um desvio preocupante!), gente que fica embirrada
quando não consegue o que quer, quando se declara rei ou rainha, mas não
é aclamado(a) pelo “povo”, quando sua forma de “brincar sua fantasia”
não é aceita e aplaudida por alguém. Às vezes, rola briga e gente
imatura sai zangada, reclamando, e procura seus “amigos” para
choramingar e lamentar: <<Olha gente como fui maltratado(a)! Quis
ser rei/rainha e brilhar aqui no castelo (Facebook), mas fulano disse
que eu só presto para ser dragão>> – coisa que fulano nem disse,
mas isso torna a coisa mais dramática e acentua o papel de vítima.
<<Consolem-me, por favor!>>. São formadas então fracções e
coligações e o “dragão” volta com seu “exército” de embirrados, pronto
para atacar quem quer que seja, por lealdade ao “amigo(a)” e por gostar
de uma briguinha. E o ataque (infantil) começa: “Você não pode ser rei,
pois seu nariz é torto!”, “você não pode ser rainha, pois mais parece
uma bruxa”, “você não pode ser cavaleiro, pois mais parece um cavalo”. E
a infantilidade continua, continua, continua… E rende, rende, rende, já
que, como no mundo real das crianças birrentas, só se quer uma coisa:
ter razão, custe o que custar! E, se não for por bem, então vai na
birra…
Se alguém acha que estou exagerando, que
pare um pouco para ler determinados posts e comentários pelo Facebook
afora. Muitas vezes, falta qualquer objetividade, adultos discutem
realmente como se fossem crianças embirradas, críticas são imediatamente
tomadas como ofensas pessoais, que são devolvidas então como insulta
pesada, os fatos são torcidos, a hostilidade é grande e, quando se junta
a capacidade de abstração infantil com a prepotência adulta, o controle
é muitas vezes perdido e qualquer forma de civilidade e qualquer
capacidade de diálogo desaparecem. Pessoas adultas se comportam de uma
forma infantil, imatura, cobram sua liberdade de opinião, mas não
aceitam que os demais têm o mesmo direito. Qualquer opinião alheia é
recusada, exceto quando se trata de um elogio, de alimento para uma
autoestima baixa.
Se não fosse a sobriedade de alguns,
realmente adultos, que conseguem discernir entre o mundo real e virtual e
sabem se comportar adequadamente nos dois, o Facebook poderia ser visto
como um verdadeiro hospício!
Não, não estou querendo aqui criticar o
Facebook, redes sociais ou mesmo a internet. Não é isso. Como em tudo,
há vantagens e desvantagens e sei muito bem usufruir das vantagens do
mundo virtual. Só reflito aqui “em voz alta” sobre o comportamento de
certos usuários, sobre a forma como muitos usam determinadas ferramentas
e sobre o que se encontra por trás disso.
O mundo virtual não é para mim realmente
virtual, já que por trás de cada perfil há uma pessoa real. A internet
não é (ainda) totalmente controlada por máquinas. Ela é feita por
pessoas e o mundo virtual, em minha opinião, é um espelho do mundo real.
Mesmo que sejamos mais extremos na internet (por nos acharmos
protegidos por uma suposta anonimidade?), os rastros que deixamos aqui é
reflexo do que nos move e preenche ou que nos prende e esvazia no mundo
real.
Portanto, não creio que essas
animosidades de “birrentos cibernéticos” sejam algo “da internet”. Quem
se comporta assim ou assado virtualmente é porque se comporta do mesmo
jeito no mundo real (ou gostaria, mas não tem coragem ou espaço para
isso). Toda essa hostilidade e toda essa infantilidade que vemos por
aqui tem sua origem em vaidade, orgulho, frustração, amargura,
complexos, limitações reais. A coisa vai tão longe que blogueiros
famosos (por exemplo, Leonardo Sakamoto – Por que fechei meu blog para comentários)
não permitem mais comentários em seus posts, alegando que eles perdiam
muito tempo moderando a “loucura” de certas pessoas, que só comentavam
para polemizar, reclamar, insultar e hostilizar, sem nada oferecer, sem
nada construir.
Penso que ainda vamos precisar de algum
tempo até aprendermos a lidar corretamente com o mundo virtual e com
seus desvios e loucuras. Observando a velocidade com que o mundo digital
tem se desenvolvido nas últimas décadas, compreendo que ainda estejamos
deslumbrados com uma tecnologia que se encontra engatinhando. Acredito
que a internet se desenvolverá ainda mais no futuro próximo, tornar-se-á
ainda mais poderosa e sua presença em nossas vidas será ainda maior. Só
espero que possamos desenvolver também técnicas adequadas para lidar
com as excrescências, pois a internet, mesmo sendo uma benção na vida do
homem moderno, tem seu lado negativo, para não dizer perverso. Mas
creio que o melhor caminho para encerrar ou pelo menos reduzir
comportamentos imaturos e hostis na internet seria o de (re)educar
urgentemente as pessoas no mundo real, pois acho que é isso que falta. E
isso se recebe em casa, na escola e no meio social real de cada um, não
na internet.
Texto Original: Caminhos