Por Clara Baccarin
Da vida quero o que é simples, mas de boa qualidade.
Troco um jantar requintado por um arroz-feijão feito em casa refogado com muita cebola, alho e papo furado.
Gosto dos sentimentos simples, mas bem
temperados. Do sorriso caseiro com uma pitada de pimenta. Das receitas
simples de felicidade, fáceis de decorar, de seguir e de ensinar. Gosto
de um canteiro de afeto cultivado no aparador da janela. Do cheiro
acolhedor invadindo a casa e os corações. Das falas fáceis, da risada
solta, dos medos guardados do lado de fora da porta de entrada.
Gosto de comer me reconhecendo nos
sabores. De lembrar a riqueza que é apreciar sentimentos familiares.
Gosto de me sentir em casa dentro de mim quando estou perto do outro.
O meu castelo é de fantasia, construído
dentro da casinha simples do interior. Nele, as paredes não possuem
muitos quadros, a cozinha não precisa de muitos apetrechos, os armários
não guardam grandes segredos. Mas as janelas são amplas, boas de se
perder a vista.
No meu lar não sei receber visitas
ilustres, cheias de etiquetas, de pompas e de mistérios. Este lar é
‘pobre’, porém limpinho. Quem chega descalçando os sapatos é bem vindo. E
também são bem vindos aqueles que se deixam invadir sem medo, daquele
jeito ingênuo de quem nunca percebeu as segundas intenções do mundo.
Aqueles que tratam até os estranhos como ‘de casa’. E eu, se preciso,
jogo mais água no feijão para fazer render a amizade e a boa companhia.
É que aqui, os sentimentos são antigos, talvez até antiquados, cozidos em panela velha, devem ser resultado de receita de avó.
As tarefas da casa são simples, mas há
de executa-las com carinho. Qualquer frescura pode ser substituída por
uma boa dose de afeto. E no final do dia, uma mão lava a outra.
Às vezes as roupas sujas se acumulam num
canto da casa, mas a gente perde um tempo e lava tudo aqui dentro
mesmo, no dia seguinte fica tudo às claras outra vez. As mágoas vão para
o ralo junto com a espuma do sabão de coco.
Da vida quero o que é simples mas de boa
qualidade. Quero pessoas que trazem o que podem, mas se compartilham
por inteiro e quando se afastam, carregam lembranças bem nutridas e
corações satisfeitos.